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Samakuva escreveu ao TC na “calada”. À boca pequena já se fala em possível destituição

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As achas foram lançadas na fogueira no último domingo, 24, pelo comentador residente da TV Zimbo, David Mendes, e num espaço de análise sobre a actualidade sociopolítica e económica do país, no qual este último tem debitado as mais virulentas e insanáveis críticas à figura de Adalberto Costa Júnior — um ‘inimigo’ declarado de quem o deputado e analista já não esconde a ‘face de ódio’ que lhe dedica todos os fins-de-semana.

A revelação segundo a qual Isaías Samakuva havia escrito para o Tribunal Constitucional trazida a público pelo também político eleito deputado à Assembleia Nacional a reboque da lista da UNITA, nas eleições de 2017, ecoou nas redes sociais e foi confirmada pelo próprio Samakuva, nesta segunda-feira, 25, quando, depois de ter tomado posse como novo membro do Conselho da República, falou à imprensa e ofereceu o rosto à verdade.

Na voz do presidente reconduzido do Galo Negro ouviu-se o que muitos julgaram ser mais uma ‘tirada política’ por parte de David Mendes contra o seu crónico e selecto inimigo, visando aprofundar o caos em que já se encontra o entendimento do processo que culminou com a decisão do acórdão do TC de destituir Adalberto Costa Júnior do cargo de presidente eleito da UNITA em 2019.

Um pedido de esclarecimento, tal como afirmou à TV Zimbo David Mendes, foi, de facto, formulado ao TC por Isaías Samakuva, a fim de “diluir dúvidas sobre as suas competências neste regresso à liderança da UNITA”.

“Fiz, de facto, uma carta ao Tribunal Constitucional para pedir um esclarecimento de certas dúvidas que surgiram ao ler o acórdão”, admitiu o presidente da UNITA, Isaías Samakuva, aos jornalistas, momentos depois de ter tomado posse como membro do Conselho da República.

Nesta segunda-feira, mais do que voltar a lançar uma onda especulativa, a revelação voltou a baralhar as contas do XIII Congresso Ordinário, agendado para a primeira semana de Dezembro, tal como já deliberou a Comissão Política (CP), no dia 20 de Outubro.

A declaração é sobretudo intrigante e até mesmo paradoxal, se se partir do princípio que a própria UNITA acatou o acórdão e depois, acto contínuo, em comunicado final da sua Comissão Política, o condenou, classificando-o como “uma armadilha política”, que visa semear a divisão no seio do partido. Na verdade, o puzzle até aqui estava incompleto.

A agravar ainda mais a confirmação dada por Isaías Samakuva à imprensa está igualmente um dado que até aqui não tinha sido ainda tornada público: o líder da UNITA escreveu ao Tribunal Constitucional para tirar dúvidas sobre as suas competências à frente do partido sem ter prestado qualquer esclarecimento prévio à Comissão Política. Aliás, esta foi apenas informada uma semana depois.

Ou seja, mais palavras, menos palavras, Samakuva fê-lo na “calada”, uma semana antes de convocar a reunião da Comissão Política, sem, no entanto, avisar os órgãos do partido, de acordo com dados a que o !STO É NOTÍCIA teve acesso esta segunda-feira. Com que pretensões e com que objectivos? Disse-o abertamente Samakuva aos jornalistas, e disse-o também na reunião Comissão Política, uma semana depois. Mas, esta decisão de Isaías Samakuva terá levantado ainda mais suspeições do que propriamente sanado o problema.

No seio do Galo Negro a notícia da carta ao TC incomodou os estômagos mais sensíveis do partido, contou uma fonte deste jornal. Porém, à data dos factos, a UNITA guardou a sete chaves aquilo que para alguns chegou a soar como um murro desferido na zona abdominal, apesar do silêncio que se fez à volta da informação. Ou seja, a UNITA não deixou escapar o assunto para a hasta pública, nem tão-pouco fez do caso mais um caso.

Na sala do Complexo Sovsmo, em Viana, as declarações — na verdade, a leitura do conteúdo de tal carta  enviada ao TC —, confrangeu a audiência, porque, explicou a fonte do !STO É NOTÍCIA, Samakuva não só não entrega uma cópia do documento à “magna assembleia” do partido, como proferiu uma leitura que para alguns lembrava um “discurso algo lacónico”.

“Não me lembro, porque a leitura que ele fez não foi propriamente para esclarecer [o assunto]”, confidenciou uma fonte do Galo Negro a este jornal, quando questionada se — com base no conteúdo da carta enviada ao TC e apresentada à Comissão Política — haviam sido levantadas questões de fundo das quais se lembrava.

Mas, a polémica não pára por aí e nesta segunda-feira teve inclusive o patrocínio do Presidente da República. Ao desejar que Isaías Samakuva tenha regressado ao Conselho da República “para ficar”, tal como se expressou, o Presidente João Lourenço não só sinalizou uma clara preferência por Samakuva, em detrimento de Adalberto Costa Júnior, como levou a que, a nível interno, a UNITA começasse a revelar algum nervosismo e inconformismo em relação à lealdade que se espera(va) do actual líder.

O !STO É NOTÍCIA sabe de uma fonte bem colocada que, a partir desta segunda-feira, vários cenários começaram a ser desenhados e colocados sobre a mesa, e um deles poderá vir a ser a destituição de Isaías Samakuva, caso se confirme aquilo que poderia ser entendido com uma traição aos princípios e valores do partido.

A alimentar estas suspeitas estão as coincidências nem sempre inocentes na política, como aquela que se ouviu de Samakuva, aquando da sua declaração aos jornalistas na cerimónia de tomada de posse no Conselho da República: “Esta responsabilidade [de membro do Conselho da República] leva-nos a trabalhar para a unidade nacional e a estar mais próximo do senhor Presidente da República”.

Suspeitas ou não, receios ou não, polémica à vista ou não, receios levantados ou não, o !STO É NOTÍCIA soube que tudo pode pode ser decidido a nível da mesma Comissão Política, que decidiu esmagadoramente pela realização do congresso entre os dias 2 e 4 de Dezembro do corrente ano.

“Se se confirmarem os rumores levantados hoje, o mais-velho Samakuva pode ser destituído. Para isso, precisa-se de dois terços dos membros da Comissão Política e aí entorna o caldo todo. Se se confirmarem ligações ao MPLA, será destituído por traição.  Havendo destituição, entra uma comissão de gestão, que convoca o congresso e tudo volta à normalidade”, antevê uma fonte do órgão.

O !STO É NOTÍCIA sabe também que, até esta segunda-feira, 25, o Tribunal Constitucional ainda não tinha respondido às perguntas colocadas por Isaías Samakuva, ou pelo menos, o líder da UNITA não notificou o partido de já ter recebido as respostas às questões colocadas.

Resta agora saber se as questões de ordem burocráticas levantadas pelo presidente da UNITA, que poderiam condicionar a realização das eleições, serão ou não suficientes para o adiamento do pleito, ou se novos factos poderão vir a ser retirados da ‘cartola’. No entanto, uma convicção alimenta a fonte deste jornal: “Tudo que se fizer deverá ser feito com base no estatuto do partido”.

Nok Nogueira

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