UNITA atribui nota negativa ao recém-terminado ano parlamentar e diz que exercício legislativo serviu apenas para “diplomacia e marketing político-institucional”
O Grupo Parlamentar da UNITA (GPU) considera que a Assembleia Nacional voltou a fracassar, pelo segundo ano consecutivo da V Legislatura, ao não cumprir a sua principal missão constitucional: a de ser um Poder Legislativo por excelência da República de Angola, num ano em que a produção legislativa, por iniciativa do Parlamento, “foi quase nula” e dominada pelo titular do Poder Executivo.
Na conferência de imprensa de balanço do segundo ano parlamentar da V Legislatura que apresentou ao país na sexta-feira, 23, o GPU — que atribuiu nota negativa à acção legislativa da Assembleia Nacional —, não poupou críticas à postura pouco produtiva do Parlamento e pelo de o órgão ter actuado mais com o intuito de salvaguardar aquilo a que chamou de “aparências”.
“Durante o ano parlamentar, houve mais diplomacia e marketing político-institucional do que produção legislativa, fiscalização dos actos de governação ou até mesmo atendimento a reclamações e denúncias dos cidadãos. Houve mais preocupação com a aparência do que com a obediência à Constituição, o respeito pelo regime democrático e a fiscalização efectiva dos actos de governação”, alegou no balanço apresentado o maior partido na oposição.
Para a bancada parlamentar da UNITA, “ainda não foi desta vez, no segundo ano da V Legislatura, que o Parlamento da República de Angola conseguiu afirmar-se, no plano institucional, como poder soberano com identidade própria, separado e independente do Poder Executivo, capaz de interpretar e afirmar em cada acto legislativo a vontade soberana do Povo”.
Para contextualizar a relação de dependência de um poder (Legislativo) ao outro (Executivo), o GPU recorreu ao episódio de 14 de Outubro de 2023, aquando da realização da Reunião Plenária Extraordinária, convocada para votar a constituição de uma Comissão Eventual sobre o Processo de Acusação e Destituição do Presidente da República.
Para a UNITA, à data dos factos, o grupo de deputados do MPLA, mesmo diante de “dezenas de provas documentais de crimes de violação da Constituição que atentam gravemente contra o Estado Democrático de Direito, preferiu violar o juramento que fez, votar contra a soberania do povo e contra a supremacia da Constituição, só para se subordinar à vontade do senhor Presidente da República”.
O maior partido na oposição lamentou igualmente a improdutividade da Assembleia Nacional em relação às iniciativas legislativas, justificando que apenas o seu grupo parlamentar apresentou e fez aprovar um projecto de lei, quando as demais iniciativas foram todas de expedientes provenientes do titular do Poder Executivo.
Sobre as audições parlamentares, as quais apelidou de “meros exercícios de propaganda institucional, sem nenhum impacto nas práticas de governação”, a UNITA desvalorizou a sua realização, uma vez que acabaram por não produzir qualquer efeito “na qualidade dos serviços públicos e na melhoria das condições de vida das pessoas, dos trabalhadores e das famílias”.
“Também não foi constituída nenhuma Comissão Parlamentar de Inquérito para averiguar as inúmeras queixas e reclamações dos cidadãos relativas a violações de direitos humanos, abusos de poder e corrupção da parte de titulares de cargos públicos”, lamentou o GPU, acrescentando que também “não foi desta vez, no segundo ano da V Legislatura, que os deputados conseguiram se afirmar como deputados de todo o povo para exprimir a vontade soberana do povo, e não a vontade de um homem”.
“Não é preciso fazer consulta pública para determinar se, para o povo, o que é prioritário é acabar com a fome ou criar mais províncias, mais municípios e mais comunas, só para aumentar a despesa pública em si mesma já improdutiva e opaca”, começou por dizer a UNITA, para mais tarde desferir uma dura crítica à iniciativa legislativa de alteração da divisão político-administrativa do país.
Para o GPU, não faz sentido que um governo, “que não tem folga orçamental nenhuma, não tem dinheiro para pagar salários e pensões em tempo útil; que não tem expectativas de aumentar a receita e que vive de dívidas para pagar dívidas”, arranje “mais despesas desnecessárias com salários e regalias para mais 162 administradores municipais e 324 adjuntos, três novos governadores provinciais, seis novos vice-governadores provinciais”.
“Os angolanos não se devem deixar enganar. Não se trata de procurar maior proximidade dos serviços da administração pública para as populações, porque o ente constitucional autónomo que aproxima a administração pública aos cidadãos e ajudar a resolver os problemas locais são as Autarquias Locais. Só as Autarquias Locais, enquanto órgãos democráticos, autónomos e descentralizados do Poder Local, podem repartir com o Estado os recursos públicos locais para o benefício das populações”, afirmou a UNITA, concluindo:
“Criar novas províncias e novos municípios, todos eles dependentes de um poder centralizado num só órgão, num só homem, só para inviabilizar o exercício da democracia participativa pelo povo soberano de Angola, constitui uma ofensa à Constituição, que atenta gravemente contra o Estado Democrático de Direito”.