Isabel dos Santos revela que juiz de garantias não a quis ouvir e ignorou todas as provas e testemunhas da fase de instrução contraditória
A ex-presidente do Conselho de Administração da Sonangol Isabel dos Santos denunciou, nesta quinta-feira, 20, o “desvio de conduta” do juiz de garantias do Tribunal Supremo que exarou o despacho de pronúncia do caso da petrolífera angolana, acusando-o de se ter recusado a ouvir as declarações das testemunhas por si indicadas e de ter ignorado todas as provas apresentadas na fase de instrução contrário do processo.
Numa nota de esclarecimento, datada de 20 de Novembro de 2025, Isabel dos Santos revela que o juiz de garantias “não escreveu no despacho de pronúncia uma única palavra sobre a prova apresentada, sobre os argumentos e factos, e testemunhas ouvidas”, além de se ter recusado ouvi-la, quando a defesa pediu que ela prestasse declarações durante a fase de instrução contraditória.
No comunicado, Isabel dos Santos afirma que, depois de ter sido notificada do despacho de pronúncia, de 22 de Outubro, a defesa apresentou, no dia 14 de Novembro de 2025, ainda dentro dos prazos previstos na lei, um recurso com 436 páginas, no qual “demonstra os múltiplos erros da decisão do juiz de garantias” e “principalmente os erros quanto aos factos”.
“Essas provas foram produzidas e apresentadas, bem como as testemunhas fizeram vários depoimentos que contrariam a acusação da PGR [Procuradoria-Geral da República] ao Tribunal Supremo, mas, na decisão de pronúncia que agora foi proferida pelo juiz, não há uma única palavra sobre a prova produzida entre Abril de 2025 e Outubro de 2025, tendo o tribunal, ilegalmente, não apenas ignorado, mas também omitido tudo o que foi demonstrado”, consteta a nota.
Testemunhas ignoradas
Ainda de acordo com o comunicado, durante a fase de instrução contraditória, foram apresentados ao juiz documentos, actas do Conselho de Administração da Sonangol, pedidas as gravações das reuniões à Sonangol e ouvidas sete das 73 testemunhas apresentadas pela defesa de Isabel dos Santos.
Foi ouvido o represente da PricewaterhouseCoopers (PwC) Angola, Ricardo dos Santos; o ex-presidente da Comissão Executiva da Sonangol Paulino Jerónimo; o ex-administrador da Sonangol César Paxi; Jaime Esteves, da PwC; Paulo Trindade Costa, advogado da Vieira de Almeida – Sociedade de Advogados (VdA); Rui Andrade, advogado que prestou serviços em representação da VdA; e Alexandre Gorito, ligado à Boston Consulting Group (BCG). Todos essas testemunhas, segundo o comunicado, foram ouvidos pelo juiz de garantias que exarou a pronúncia.
“Não há uma única referência, sequer, às provas ou às declarações que as testemunhas prestaram ao juiz de garantias no despacho de pronúncia. O juiz, desta forma, ignorou o que foi perante si dito e que contrariaria por completo a acusação da PGR”, conclui a nota de esclarecimento.
Recurso à pronúncia
O recurso ao despacho de pronúncia argumenta igualmente que não foi ponderado o facto de a decisão de pagamento aos consultores ter resultado de uma acta do Conselho de Administração da Sonangol do dia 27 de Março de 2017, em cuja deliberação Isabel dos Santos se absteve de decidir e votar; assim como o facto de não se ter analisado a acusação do crime de fraude fiscal qualificada dizer respeito a um alegado não pagamento de impostos a 31 de Dezembro de 2017, numa altura em que Isabel dos Santos já não estava em funções.
A nota refere-se também ao pagamento por parte da Sonangol (HK) Limited à Monjasa, que, segundo atesta, “foi autorizado por Sandra Júlio nos dias 7 de Setembro de 2017, 19 de Outubro de 2017, 21 de Novembro de 2017 e 22 de Dezembro de 2017, tendo o referido contrato de fornecimento sido celebrado entre a Sonangol Distribuidora SA, a Sonangol (HK) Limited e a Monjasa, com data de 16 de Agosto de 2017”.
“Julgamento inútil”
“Em representação da Sonangol Distribuidora SA assinaram Filomena de Jesus Costa Rosa (esposa de Carlos Saturnino) e Bernardo Viveiro António, e em representação da Monjasa, Anders Ostergaard”, acrescenta a nota, esclarecendo “que tal contrato da Monjasa nada tem a ver com a Eng.ª Isabel dos Santos, nem teve a sua intervenção”.
Por último, a nota refere que, caso a decisão de pronúncia se mantenha, “a Eng.ª Isabel dos Santos será submetida a um julgamento inútil, uma vez que a prova documental e as testemunhas contrariam, por completo e na totalidade, a acusação da PGR, sendo, sem qualquer dúvida, absolvida de todos os crimes”.