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Impala Express viola circular ministerial nas ‘barbas’ do GPL e adquire autocarros sem contrato de exploração urbana

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Os regulamentos são instrumentos jurídicos orientadores e fiscalizadores da legalidade administrativa ou contratual, que contêm normas para a execução de uma determinada acção ou actividade. Não é o que parece estar a acontecer no sector do transporte urbano na capital, onde as autoridades provinciais, há pelo menos mais de três meses, assistem impávidas e serenas a um claro atropelo a uma norma ministerial que envolve dois entes públicos e um privado, sendo que este último age de forma descarada nas ‘barbas’ dos órgãos competentes.

O facto em causa remonta ao mês de Agosto do corrente ano, altura em que a redacção deste órgão de comunicação tomou contacto com a informação que dava conta da aquisição, por parte da empresa Impala Express – Transportes, Limitada, de um número não especificado de autocarros ao Governo Provincial de Luanda (GPL), à margem dos requisitos exigidos no regulamento ministerial: o contrato de concessão de exploração de carreiras para o transporte rodoviário regular urbano colectivo de passageiros.

A circular do Ministério dos Transportes (Mintrans), datada de 11 de Julho de 2019, determina, entre outros requisitos, que as empresas elegíveis para o licenciamento da actividade de transporte rodoviário regular de passageiros devem participar de um concurso público para o efeito, a fim de se habilitarem, junto dos governos provinciais, a um contrato de exploração urbana, nos termos do Despacho Presidencial n.º 154/10, de 26 de Julho (Regulamento de Transportes Rodoviários Regulares de Passageiros).

A 15 de Agosto do corrente ano, o Ministério dos Transportes — num acto presidido pelo titular da pasta, Ricardo Viegas D’Abreu —, procedeu à entrega de 71 autocarros ao GPL, no âmbito do programa de reforço do transporte urbano de passageiros, com o objectivo de minimizar o problema da mobilidade urbana na capital. Esses 71 de autocarros fazem parte do universo de 1500 que inicialmente faziam parte do programa ‘Transporte para Todos’, destinado ao serviço de transporte escolar, aprovado pelo governo ainda na gestão de Augusto da Silva Tomás.

Elaborado pelo governo, em 2017, no quadro do contrato celebrado com a empresa uruguaia Asperbras Limitada – Sociedade Comercial, no valor global de USD 383.500.000,00 (Trezentos e oitenta e três milhões e quinhentos mil dólares norte-americanos), o projecto foi reconvertido pelo actual pelouro dos Transportes, dirigido por Ricardo Viegas d’Abreu, para atender o sector urbano.

Informações apuradas junto das operadoras licenciadas confirmam que o último concurso público, promovido pelo GPL, para a aquisição de transportes urbanos foi realizado em 2020. À data dos factos, no leque de operadores de transporte rodoviário urbano regular de passageiros de Luanda não constava a empresa Impala Express – Transporte, Limitada, que acabava de surgir no mercado, de acordo com os dados consultados no Diário da República do dia 30 de Janeiro de 2020.

Outras informações a que o !STO É NOTÍCIA teve acesso indicam que, apesar de ter surgido formalmente no mercado em Janeiro de 2020, a empresa Impala Express não tinha qualquer tipo de vínculo contratual com o Governo da Província de Luanda, no quadro dos requisitos de carácter obrigatório definidos pela circular do Ministério dos Transportes, que a habilitaria a realizar a exploração de carreiras para o transporte rodoviário regular urbano colectivo de passageiros.

Uma série de questões à volta do assunto foram, formalmente, levantadas junto do GPL através de uma correspondência enviada, a 30 de Agosto deste ano, à governadora Ana Paula de Carvalho, porém, volvidos mais de 90 dias, a ‘timoneira’ da capital e o seu governo limitaram-se a manter-se em silêncio, alimentando ainda mais as suspeitas e inquietações sobre um negócio com bastantes zonas cinzentas, que acabou por contemplar uma entidade “alheia” à lista de operadoras licenciadas para aquele tipo de actividade de transporte rodoviário de passageiros.

E mais: a atribuição dos 71 autocarros visava o reforço do transporte urbano de passageiros, ou seja, destinava-se às operadoras com as quais o GPL mantinha e mantém celebrado o referido contrato de exploração de carreiras para o transporte rodoviário regular urbano colectivo de passageiros, já que a circular do Ministério dos Transportes define, entre outros, os requisitos para os governos provinciais apresentarem às empresas consideradas elegíveis em concurso público, sendo estes requisitos de carácter obrigatório.

Segundo o disposto no referido documento, os governos provinciais devem identificar e eleger empresas mediante critérios de afectação definidos no mesmo, estando esta selecção sujeita à validação do Ministério dos Transportes através do Instituto Nacional dos Transportes Rodoviários (INTR), enquanto entidade reguladora.

Porém, o contacto estabelecido com o referido órgão afecto àquele departamento ministerial mostrou-se infrutífero, tendo o seu responsável, Énio Renato, afirmado que “não responde a questões relacionadas com o transporte urbano”, quando o documento oficial afirma que é da sua competência a validação.

O !STO É NOTÍCIA soube, entretanto, de uma fonte digna de crédito que, muito embora não tenha participado do concurso público realizado em 2020, a Impala Express, ainda assim, conseguiu ter acesso e adquirir os autocarros que ficaram em stock, ou seja, o remanescente de veículos do concurso daquele ano, fruto do qual, em Agosto deste ano, as operadoras licenciadas beneficiaram de novos meios no âmbito do programa de reforço da capacidade existente.

Violação da circular pelo GPL e pelas operadoras

Uma segunda ‘violação’ da circular do Ministério dos Transportes foi registada poucos dias depois da entrega dos 71 autocarros ao Governo da Província de Luanda. Um dos requisitos para que as empresas pudessem ter acesso aos referidos meios era a observância do plasmado na circular do Mintrans, mas tal não aconteceu, porque nenhuma operadora, à data de entrega dos autocarros, tivera liquidado o chamado down payment.

As empresas selecionadas, incluindo a Impala Express — que aparece também no lote de empresas com as quais o GPL celebrou, em 2020, contrato de concessão de exploração urbana —, deviam ter procedido ao pagamento de uma parcela inicial na ordem dos 5% do valor de cada autocarro, correspondendo a 2.917.746,65kz (dois milhões, novecentos e dezassete mil, setecentos e quarenta e seis kwanzas e sessenta e cinco cêntimos).

Fontes familiarizadas com o dossier disseram, categoricamente, ao !STO É NOTÍCIA que o referido valor não foi logo pago, tendo as empresas assinado a posterior um ‘termo de responsabilidade’ em como se comprometiam a procederem ao pagamento, violando assim a circular que exige o pronto pagamento do down payment para que estas pudessem ter acesso aos veículos.

Além do pagamento dos 5% do valor total de cada autocarro, as operadoras contempladas estavam obrigadas a pagar a parcela mensal no montante de 461.978,55kz (quatrocentos e sessenta e um mil, novecentos e sete e oito kwanzas e cinquenta e cinco cêntimos) por cada autocarro, a partir do quinto dia do mês subsequente à assinatura do contrato, por um período de 120 meses, até à amortização do valor total, de 58.354.933,00kz (Cinquenta e oito milhões, trezentos e cinquenta e quatro mil e novecentos e trinta e três kwanzas).

Na abordagem feita junto do gabinete da governadora provincial de Luanda, Ana Paula de Carvalho, não foi possível obter qualquer pronunciamento da titular da pasta acerca dos alegados atropelos que teriam ocorrido na data de entrega dos 71 autocarros, incluindo o envolvimento da empresa Impala Express, que não estava licenciada para tal.

Muitas outras questões colocadas ficaram sem resposta por parte do GPL, tais como o valor arrecadado após o alegado pagamento do down payment das operadoras, bem como o número preciso de autocarros que cada uma delas levou, incluindo a Impala Express — a única operadora com a qual o GPL não tinha à data um contrato para aquele segmento de negócio.

Lembrar que, por ocasião da entrega dos 71 autocarros, o director provincial dos Transportes, Tráfego e Mobilidade Urbana do GPL, Filipe Cumandala, admitiu ao semanário Expansão que se estava a equacionar a retirada das viaturas atribuídas por concurso público em 2020 a um conjunto de empresas de transportes públicos “incumpridoras”, por “não disporem de condições técnicas para operar”.

Do referido grupo de “operadoras incumpridoras” constavam também aquelas que estavam em falta em relação ao pagamento das prestações mensais dos autocarros recebidos aquando do concurso público realizado em 2020.

Filipe Cumandala disse ainda, na ocasião, que muitas das operadoras “não têm uma base com as condições técnicas exigidas, como posto de abastecimento de combustível e estação para lavar as viaturas”, entre outras.

“Estamos a reestruturar o sistema de transportes, as empresas sem condições poderão avançar para uma fusão com outras que reúnam os requisitos, ou então o governo vai retirar os autocarros”, admitiu o director provincial dos Transportes, Tráfego e Mobilidade Urbana do GPL.

 

Nok Nogueira

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