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China admite cenário de crise diplomática com Angola e suspeita de interferências externas no julgamento dos generais Kopelipa e Dino

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O director para África do Ministério das Relações Exteriores da China, Yu Yong, admitiu a existência de um cenário de crise diplomática com Angola e garantiu que Pequim acompanha com alguma expectativa o julgamento dos generais Kopelipa e Dino e o China International Found (CIF), devido a uma possível interferência de outros países.

Em declarações ao jornal Valor Económico, Yu Yong rompeu o silêncio sobre o julgamento e avisou categoricamente que há risco de uma “crise diplomática”, ou seja, reconhece o seu impacto sobre o cálculo da dívida de Angola à China.

O diplomata alertou para o risco de a sentença deste julgamento poder ser “influenciada” por interesses externos, pelo que apela à “racionalidade e objectividade” na deliberação que também envolve o empresário chinês Yiu Haiming, rosto por trás do CIF.

Yu Yong disse que, em caso de um “julgamento viciado” do empresário chinês, as relações entre Pequim e Luanda podem ganhar outro destino. Para o diplomata, a conduta das empresas e cidadãos chineses deve ser avaliada tal como é avaliada a dos angolanos. “Não são superiores, nem inferiores, não podem ser privilegiados nem mais prejudicados”, avisou.

Os dois generais [Kopelipa e Dino] são acusados de tráfico de influências, branqueamento de capitais, falsificação de documento, associação criminosa e abuso de poder, sendo que uma eventual condenação pode colocar em causa o efectivo montante da dívida de Angola à China, daí o pronunciamento de Yu Yong.

A 31 de Março deste ano, o Tribunal Supremo (TS) tinha adiado por sete dias o julgamento devido à ausência de qualquer mandatário do CIF na sala de audiências, tendo a juíza do caso Anabela Valente dado sete dias para que tal acontecesse, avisando que, em alternativa, iria indicar um defensor oficioso, facto que não se concretizou. A 14 de Abril, o julgamento foi adiado sem data prevista de retorno.

O mal-estar da China, traduzido numa deterioração das relações bilaterais que culminou com a decisão do Presidente João Lourenço de cancelar a sua presença, em Setembro de 2024, no Fórum para a Cooperação China-África (FOFAC), realizado em Pequim, tinha sido até agora silencioso.

A eventual condenação dos generais Kopelipa e Dino e também do CIF vai ser uma arma fundamental para o governo angolano voltar à carga junto da China com o objectivo de discutir a questão do efectivo montante da dívida.

Caso seja dado como provado que os dois generais se apropriaram indevidamente de empréstimos concedidos por instituições chinesas que tinham como destino o Estado ou empresas públicas, isso significaria que se abre a porta para invocar o argumento de que Angola não poderá ser responsabilizada pelos encargos de dívida que resultaram dos mesmos.

Este julgamento, ao que tudo indica, transformou-se em meio para atingir um fim mais abrangente, o de provar que o Estado angolano não pode ser responsabilizado pelo pagamento de uma dívida referente a valores que nunca chegaram aos cofres públicos.

Este poderia ser apenas um debate teórico, mas as declarações proferidas pelo director para África do Ministério das Relações Exteriores da China mostra que é muito mais do que isso. Ou seja, Pequim vê esta hipótese como uma ameaça real e, furando a regra de ouro do silêncio mediático que usa recorrentemente, sentiu agora a necessidade de recorrer à comunicação social para advertir o governo angolano de que o cenário de uma “crise diplomática” é mesmo real.

A dívida de Angola à China situa-se nos 14,9 mil milhões de dólares norte-americanos e os planos do governo passam por a sanear totalmente até 2028. O serviço da dívida para 2025 que Luanda terá de satisfazer junto de Pequim está calculado em 4,1 mil milhões USD.

*Com o jornal Negócios

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