Relatório do MUDEI expõe a barbárie protagonizada pelo governo em Julho e exige investigações aos assassinatos
O último relatório intercalar do MUDEI, elaborado por três organizações da sociedade civil angolana, acusa o governo de usar a Constituição apenas “como um papel decorativo, enquanto a Polícia Nacional e os tribunais se transformam em instrumentos de medo”. O documento expõe detalhes da actuação bárbara das forças de defesa e segurança, a mando do governo, e exige investigações aos acontecimentos de Julho último.
Elaborado pela Associação Cívica Handeka, pela Associação Mizangala ‘Tu Yenu Kupolo’ e pelo Movimento MUDEI, o relatório intercalar sobre violações dos direitos humanos em Angola (ver aqui) documenta os acontecimentos dos dias 28, 29 e 30 de Julho do corrente ano, reportando o caso de algumas vítimas, entre as quais menores de idade e adolescentes, e critica o governo não apenas pelo acto repressivo, mas pela “demonstração brutal de que o Estado continua a tratar os seus cidadãos como inimigos”.
“Não há democracia onde há cadáveres sem nome, mães sem resposta e prisões cheias de inocentes. A banalização da vida humana tornou-se política de Estado…”
“Matar menores, prender trabalhadores e cidadãos inocentes, torturar activistas e fazer desaparecer jovens não é manutenção da ordem: é terrorismo de Estado”, escrevem os autores do relatório, que acusam o governo angolano de usar a Constituição “como papel decorativo, enquanto a Polícia e os tribunais se transformam em instrumentos de medo”.
Repressão
Na opinião das organizações da sociedade civil, o governo angolano não governa, mas “reprime” e persegue quem denuncia essa repressão, num país onde, segundo os relatores dos acontecimentos de Julho último, “a legalidade foi substituída pela arbitrariedade e a justiça pela vingança política”.
“Não há democracia onde há cadáveres sem nome, mães sem resposta e prisões cheias de inocentes. A banalização da vida humana tornou-se política de Estado. E quem cala, consente”, refere o relatório, que lança mão a várias exigências, como “a abertura imediata de investigações independentes sobre todas as mortes, detenções arbitrárias, torturas e desaparecimentos forçados ocorridos entre os dias 28 e 30 de Julho de 2025 e nas semanas subsequentes”.
O documento exige ainda a responsabilização criminal e disciplinar dos agentes do Estado envolvidos, incluindo os mandantes políticos e operacionais; a reparação integral das vítimas e suas famílias, com garantias de não repetição; e o reforço dos mecanismos de controlo civil sobre as forças de segurança, com transparência e supervisão pública.
Restaurar a confiança nas instituições
Os autores do relatório, que admitem dificuldades na fase da documentação de todos os casos de abusos ocorridos, entendem que é chegado o momento de se colocar um ponto final aos pedidos de “favores aos captores do Estado e de se lhes exigir justiça”, uma vez que “Angola não precisa de mais mártires” e, sim, “de vergonha na cara e coragem institucional para enfrentar os seus próprios crimes”.
“É imperativo que as instituições públicas angolanas reflictam sobre os seus papéis e responsabilidades enquanto garantes da justiça e dos direitos fundamentais. É igualmente essencial que sejam tomadas medidas urgentes e concretas para corrigir os abusos relatados”, salienta o documento.
A responsabilização pelos actos ilegais e arbitrários cometidos restauraria, na opinião dos autores do relatório, a confiança da população nas instituições do Estado e criaria um ambiente que promova a igualdade, a liberdade e o respeito pelo Estado de Direito.
Movimento MUDEI
O MUDEI é um Movimento Cívico angolano de defesa do espaço cívico e democrático, que reúne indivíduos e organizações para actuar em questões como o direito de associação, a protecção de defensores de direitos humanos e o direito de reunião e manifestação pacífica.
A plataforma atua a partir de redes de colaboração, como a Plataforma Lusófona para os Direitos Humanos (PLUDH), e tem como objetivo a promoção e defesa dos direitos civis e democráticos em Angola.