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Mulher do presidente da CNE é quem ‘decidirá’ se ACJ será ou não legitimado como presidente eleito da UNITA

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Numa primeira leitura pode parecer excessivo afirmar que o presidente da UNITA, (re)eleito em Dezembro último, esteja à mercê da vontade expressa de Maria de Fátima de Lima de Almeida Baptista Pereira da Silva, a juíza-conselheira do Tribunal Constitucional indicada como relatora do processo de anotação do XIII Congresso da UNITA. Mas, somadas as contas, talvez não seja assim tão excessivo como à primeira vista possa parecer, na medida em que existem antecedentes e indicadores que podem ligar as várias “pontas soltas” e ajudar a perceber às quantas anda esse processo no plano jurídico-legal.

Para se chegar a um melhor entendimento desta leitura, considera à partida excessiva, recomenda-se um enquadramento da figura da juíza Maria de Fátima de Lima de Almeida Baptista Pereira da Silva, a escolhida pela juíza-conselheira presidente do Tribunal Constitucional, Laurinda Cardoso, para relatar um processo que há muito vem levantando inúmeras suspeitas; começando logo com a própria indicação de Laurinda Cardoso, que, num ápice, saiu do Bureau Político (BP) do MPLA directamente para aquela corte constitucional.

A chegada de Laurinda Cardoso ao TC levou ao “resgate” do ‘dossier Adalberto Costa Júnior’, tendo este culminado com a “inédita” destituição do líder do Galo Negro, e consequente anulação do XIII Congresso da UNITA, realizado em 2019. Ao que se sabia, o ex-presidente do TC Manuel Aragão havia “arquivado” ou pelo menos “sonegado” o processo, não lhe reconhecendo “mérito jurídico”.

Casada com o presidente da Comissão Nacional Eleitoral (CNE), Manuel Pereira da Silva ‘Manico’, a juíza Maria de Fátima de Lima de Almeida Baptista Pereira da Silva tem até Abril para levar à apreciação do Plenário de Juízes do TC um projecto de acórdão que deverá ser submetido à deliberação e à votação dos membros do órgão. Entretanto, questões de natureza ético-deontológicas, afectivas e/ou mesmo familiares poderão interferir e macular uma decisão que deve ser tomada com lisura e levada ao crivo do tribunal, ao qual compete especificamente administrar a justiça em matérias de natureza jurídico-constitucional.

O seu marido, juiz Manico, como também é conhecido, ocupa o cargo de presidente da CNE desde 2020, enfrentando a forte contestação de um dos candidatos vencidos no concurso público curricular para provimento da referida vaga, promovido pelo Conselho Superior da Magistratura Judicial (CSMJ), e, por conseguinte, tem “atado ao pé” um processo de impugnação da sua eleição à frente do órgão, que já dura há quase quatro anos.

As últimas informações a que o !STO É NOTÍCIA teve acesso a respeito deste dossier, davam conta que o processo andava encalhado no Tribunal Supremo, após o Constitucional ter mandado de volta para aquela instância para o pronunciamento do mesmo.

Aquando da sua investidura na Assembleia Nacional, em Fevereiro de 2020, a UNITA foi um dos partidos políticos que se opôs à tomada de posse do juiz Manuel Pereira da Silva. O líder parlamentar da UNITA, Liberty Chiaka, chegou a classificar a decisão da maioria parlamentar do MPLA de dar posse ao juiz Manico como um “acto de suicídio”. Um boicote chegou a ser “engendrado”, mas de nada serviu, porque a vontade da maioria prevaleceu.

“A casa da democracia acabou de cometer um suicídio”, afirmou na ocasião Liberty Chiaka, depois de o partido do governo recusar o requerimento que visou anular a tomada de posse de Manuel Pereira da Silva.

Agora que já se sabe quem está a relatar o processo de anotação do XIII Congresso da UNITA, voltam a avolumar-se as suspeições em redor do processo, e,  mais do que ter sido indicada uma juíza com ligações familiares ao “contestado presidente da CNE”, está também a levantar suspeitas uma exigência do TC, feita logo a seguir à realização do acto que reelegeu Adalberto Costa Júnior à frente do partido do Galo Negro.

Assim que tomou contacto com os documentos do congresso da UNITA, o Tribunal Constitucional “fez uma exigência fora do comum”, ou seja, fora daquilo que determina a Lei dos Partidos Políticos (Lei n.º 22/10, de 3 de Dezembro), em relação ao envio de documentos.

A referida lei, no seu artigo 21.º, nas alíneas de a) à l), define o timing e os documentos que devem ser enviados ao TC, dentro do prazo de 45 dias após a realização do congresso ou assembleia análoga. São os seguintes: Lista de militantes eleitos para os órgãos de direcção; cópia do Bilhete de Identidade dos militantes eleitos para os órgãos de direcção; certificado de Registo Criminal; Convocatória; Actas eleitorais provinciais dos delegados ao congresso; e o Programa com as alterações produzidas.

O mesmo artigo define ainda como documento para envio ao TC: Estatutos alterados, com a indicação das disposições estatutárias alteradas; Composição (número de membros dos órgãos colegiais de direcção do partido; e, por último, a Lista de presença assinadas pelos presentes para afeição do quórum.

Ao que apurou este portal, após entregar toda esta panóplia de documentos exigidos previstos na Lei dos Partidos Políticos, o Tribunal Constitucional solicitou, à margem destes, outros, como: Regulamento Eleitoral, Regulamento da Comissão de Mandatos, Regulamento Interno e o Regulamento do Congresso, todos estes para lá do previsto na lei que rege a vida interna das forças partidárias.

Perante a reacção da UNITA, que solicitou explicações ao TC, a corte constitucional justificou-se com o n.º3 do artigo 174.º da Constituição da República de Angola, que define que “todas as entidades públicas e privadas têm o dever de cooperar com os tribunais na execução das suas funções, devendo praticar, nos limites da sua competência, os actos que lhes forem solicitados pelos tribunais”.

Este portal sabe, entretanto, que a mesma exigência foi também apresentada ao Bloco Democrático (BD), em Agosto do ano passado, quando procedeu ao envio dos documentos exigidos por lei. O !STO É NOTÍCIA não conseguiu, porém, apurar se a UNITA chegou ou não a entregar os documentos adicionais ao tribunal.

No entanto, de acordo com informações apuradas pelo Club-K, no passado dia 25 de Fevereiro, Laurinda Cardoso reuniu-se com os membros do Plenário de Juízes do Tribunal Constitucional, a fim de lhes dar conta de que, “até ao próximo mês de Abril, todos os relatores devem concluir os seus trabalhos para feitura dos acórdãos de validação dos mesmos”.

Até à presente data, nenhum dos congressos ou convenções dos partidos considerados históricos foram validados pelo Tribunal Constitucional. O MPLA tem um processo de impugnação a decorrer naquela corte, intentado pelo seu militante António Venâncio. A FNLA enfrenta igualmente problemas com as diferentes alas, que reivindicam legitimidade dos pleitos realizados.

Nok Nogueira

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